terça-feira, 13 de março de 2012

Alguns Poemas de Maiakóvski

 

LÍLITCHKA!
Em Lugar de Uma Carta

por Vladimir Maiakóvski
(Petrogrado, 1916)

De qualquer forma
o meu amor
- duro fardo por certo -
pesará sobre ti
onde quer que te encontres.
Deixa que o fel da mágoa ressentida
num último grito estronde.

Quando um boi está morto de trabalho
ele se vai
e se deita na água fria.
Afora o teu amor
para mim
não há mar,
e a dor do teu amor nem a lágrima alivia.

Quando o elefante cansado quer repouso
ele jaz como um rei na areia ardente.
Afora o teu amor
para mim
não há sol,
e eu não sei onde estás e com quem.

Se ela assim torturasse um poeta,
ele
trocaria sua amada por dinheiro e glória,
mas a mim
nenhum som me importa
afora o som do teu nome que eu adoro.
E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com seu brilho.

Amanhã esquecerás
que eu te pus num pedestal,
que incendiei de amor uma alma livre,
e os dias vãos – rodopiante carnaval -
dispersarão as folhas dos meus livros…
Acaso as folhas secas destes versos
far-te-ão parar,
respiração opressa?

Deixa-me ao menos
arrelvar numa última carícia
teu passo que se apressa.

(trad. Augusto de Campos)

* * * * *

A FLAUTA VÉRTEBRA

A todos vocês,
que eu amei e que eu amo,
ícones guardados num coração-caverna,
como quem num banquete ergue a taça e celebra,
repleto de versos levanto meu crânio.

Penso, mais de uma vez:
seria melhor talvez
pôr-me o ponto final de um balaço.
Em todo caso
eu
hoje vou dar meu concerto de adeus.

Memória!
Convoca aos salões do cérebro
um renque inumerável de amadas.
Verte o riso de pupila em pupila,
veste a noite de núpcias passadas.
De corpo a corpo verta a alegria.
esta noite ficará na História.
Hoje executarei meus versos
na flauta de minhas próprias vértebras.

(tradução: Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman)

* * * * *

"Alô!
Quem fala?
Mamãe?
Mãe!
Teu filho está esplendidamente enfermo,
Tem um incêndio no coração.
Diz às manas Ludmila e Olga
que ele já não sabe pra onde ir.
Que cada palavra
até a mais leve graça
que lhe sai da boca ardente
salta como uma prostituta nua
fugindo de um bordel em chamas.

As gentes farejam:
- "Cheira a queimado!"
Chamaram a quem?
Brilham capacetes...
São inúteis essas botas gigantes...
Dizei aos bombeiros
que subam ao coração em chamas
com um par de carícias!
Eu mesmo
derramarei de meus olhos
tonéis de lágrimas.
Deixai que eu me apóie
em meu próprio peito.
Saltarei, saltarei, saltarei!
É inútil. Tudo desaba.
Jamais fugirás de teu próprio coração."

* * * * *

"...surpreendo o pulsar selvagem
do coração das capitais.
Desabotoado, o coração quase de fora,
abria-me ao sol e aos jatos d'água.
Entrai com vossas paixões!
Galgai-me com vossos amores!

Doravante não sou mais dono de meu coração!
Nos demais - eu sei,
qualquer um o sabe -
o coração tem domicílio
no peito.
Comigo
a anatomia ficou louca.
Sou todo coração -
em todas as partes palpita.

Oh! quantas são as primaveras
em vinte anos acesas nesta fornalha!"

* * * * *

"Amarra-me a um cometa,
como à cauda de um cavalo
e chicoteia!
Que meu corpo se estraçalhe
nos dentes das estrelas.
Ou então: quando minh'alma migratória
franzindo o cenho carrancudo
estiver diante de teu tribunal,
atira a Via-Láctea,
faz dela uma forca
e dependura-me se quiseres,
qual um criminoso.
Faze o que quiseres."

VLADIMIR MAIAKÓVSKI
(1893-1930)

Um comentário:

Unknown disse...

Oi! Você sabe onde encontro essa tradução de Nuvem de Calças? Queria ter o livro, mas com ESSA tradução, que é a que mais gosto.